sábado, 9 de fevereiro de 2008

Traços e retratos do Afeganistão

Segundo volume de "O Fotógrafo", que mescla quadrinhos com fotos, sai no Brasil; desenhista francês comenta experiência da união das duas técnicas em entrevista à Folha Online.


Em 1986, corriam nas montanhas do Afeganistão os confrontos entre os mujahidin (guerreiros islâmicos) e os russos, iniciados após a invasão pela URSS sete anos antes. Armas, helicópteros e bombas passaram a fazer parte do cotidiano poeirento, de padrões arcaicos e rurais. Foi nesse ano que o fotógrafo francês Didier Lefèvre conheceu o país.

Integrante de uma missão dos Médicos sem Fronteiras, Lefèvre registrou o que pôde - os hábitos afegãos, os mujahidin, a paisagem, o trabalho dos médicos - com um olhar apaixonado, mas que evitava os apelos da miséria e do sofrimento humano.


São essas imagens o ponto de partida da trilogia "O Fotógrafo", uma obra singular que une "graphic novel", diário e álbum de fotos. O segundo volume acaba de ser lançado no Brasil pela editora Conrad (12 páginas da obra estão disponíveis no site da editora). A multiplicidade de "O Fotógrafo" é resultado de uma parceria entre Lefèvre, o desenhista Emmanuel Guibert e o colorista (designer especialista em cores) Lemercier.

"Há quase dez anos, Lefèvre me mostrou todos os negativos - cerca de 4.000 - que ele trouxe da sua primeira missão no Afeganistão. No fim, agradeci a ele e às fotos pela extraordinária viagem no tempo e no espaço e propus fazermos um livro sobre o assunto, misturando as duas técnicas", contou o desenhista, em entrevista por e-mail à Folha. A obra foi premiada na França em 2007, no Festival de Angoulême, um dos principais do gênero, dias antes da morte de Lefèvre, aos 50 anos.

"Ele era realmente um irmão para mim. Tinha o maior afeto e admiração por ele. Lefèvre era o tipo de pessoa que torcemos para conhecer por seu talento, generosidade e senso de humor. Era um dos maiores fotojornalistas do nosso tempo, mas muito do seu trabalho é desconhecido", afirma Guibert. O fotógrafo viajou por lugares como Kosovo, Camboja e Leste Europeu - o material que produziu nesses lugares também estavam nos planos dos dois artistas.

"Não queríamos fazer outro "O Fotógrafo". A idéia era que Lefèvre criasse uma nova forma de narrar, misturando fotos e palavras, que permitisse a ele contar histórias mais próximas de um relato literário do que de um trabalho jornalístico. Desde a morte dele, penso sobre como alcançar isso sozinho, por meio de suas imagens e diários", explica Guibert.


Sem nunca ter pisado no país, ele teve que se basear nas fotos e nos relatos de Lefèvre e dos médicos da missão para desenhar a história. Havia um diário, mas foi perdido no fim da jornada pelo Afeganistão.

"É claro que, quando comecei, gostaria de poder usar o diário, mas não tinha jeito. Então, nós tivemos de trabalhar com a memória, que é um dos meu temas prediletos", diz.

"Gravei horas de conversas com ele (Guibert), ouvi tudo até que me sentisse parte daquilo. Então, começou o processo de escrita. Me convenci que deveria haver um tom literário para ser mais eficaz. Por isso, dei muita atenção ao estilo, que é o que dá vida à história", afirma.

O FOTÓGRAFO - VOLUME 2
Autores: Emmanuel Guibert, Didier Lefèvre e Lemercier
Editora: Conrad
Nº de págs.: 88
Quanto: R$ 46,00 (na compra online: R$ 41,40)

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